terça-feira, 26 de agosto de 2014

Minha avó

(imagem do artista plástico Rui de Paula.)


Minha vó tinha cabelos de india e pés descalços.
Plantava guandu e varria o terrero.
Quando o gato sumia gritava : Quede ele?
Minha vó fazia vassoura de piaçava
Assava batata na fogueira em noite de são João
E teve treze filhos.
E lembro de seus cabelos grisalhos
Que eu penteei, trancei. puxei tentando enfeitar a mulher sem vaidade.
Minha vó era guerreira, meio índia, meio branca.
Ela usava foice e plantava cana.
"Dava  de cumê pras galinha" e criava porco.
Minha vó juntava prata em lata de leite
E no final do ano me dava, a lata cheínha de moeda.
Dizia: Prata num serve pra nada.
Ela tava enganada.
Ela gostava de mim.
Eu gostava dela.
Faz tempo que não a encontro em meus sonhos.
Dona Felisbina nunca foi rica
Nem pobre, nem feliz, nem triste.
Era mãe e avó.
Analfabeta e esperta.
Criou os filhos na base da pancada.
Os netos beijava e fazia dengo
Lavou, passou e engomou pra fora
E fazia angu com rapa e chulapa.
Minha avó tinha uma caixa de botões
Costurava e ouvia rádio.
Contava muitas histórias.
Minha vó viu saci, alma penada e mula sem cabeça.
Foi mãe com doze anos.
Dona Felicia era fogo.
Apagava o fogo das filhas com a vassoura.
Ela morou na roça, no morro e em barraco.
Passou fome e teve fartura.
Trabalhava pra comprar mistura.
Nunca foi rica
Nunca foi pobre.
Era mãe e avó

(Mariani Lima)

Poema publicado pela editora Mar de Letras - Versos de Outono

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

1993

  imagem da web

Deparei-me com teu perfume no centro da cidade.
Atordoada pela surpresa, já não era eu, nem estava ali.
Pegou-me pelo cotovelo e me encostou no canto
Lembra?
Tanta gente vai e vem mas nenhum rosto conhecido.
Alívio!
Rumor
Rubor
Risos
Uma buzina
Droga!
Dissipou-se.
Não é mais inverno
Já não é mais 1993

(Mariani Lima)



terça-feira, 19 de agosto de 2014

Setembro

Há uma mulher que tece
Que faz rendados  e mora em mim.
Calada, pouco se expõe
No começo de setembro começa a falar da delicadeza das copas das árvores
Sempre me mostra uma luz aqui, um brotar de alguma coisa inesperada
Odeia os círculos que frequento. Prefere as redes e as rosas.
Gosta de céu azul e canto de pássaros mais que tudo
Contudo, esses dias tem andado diferente
Acenando mais com as mãos
Olhos transbordantes e brilho nos lábios
Nada diz, nada conta
Segue silenciosa bordando rimas e teias.
Segue calmamente a sombra de mim
Esperando a primavera,  ao fim de tarde canta um pouco
Uma canção que fala tudo
sem nada dizer.

(Mariani Lima)

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Oração dos Anseios




Quando acontecer...
Não precisa muito
Nem precisa forte
Mas que seja tanto!
Que seja profundo 
  Que me traga encanto

Não precisa hora
Não precisa nada!

Quando acontecer...
Que me leve o tempo
e me invada a alma

E que venha doce.
Venha,  ilusão!

 Que não seja amarga!
Como todas são.

(Mariani Lima)


quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Mil e Uma Noites



Vento nos cabelos
Flor nos ares
Brisa  dos sete mares

Mil e Uma Noites de pura rotina
A remar no viés da velha cortina.

(Mariani Lima)



terça-feira, 5 de agosto de 2014

Aceno

Vem!
Desliza com calma
Nas linhas da minha palma.




                                       
                                                          (imagem da Web)

domingo, 3 de agosto de 2014

Para Mim

Quando me escorro pelas linhas
Acabo pensando em você
Caro leitor, raro que me lê
E sinto desapontá-lo
Pois não me ofereço
Nem te agrado
Não  devia ser assim.
Mas só escrevo pra mim.

(Mariani Lima)