quarta-feira, 3 de julho de 2013

Minha Avó

Minha vó tinha cabelos de india e pés descalços.
Plantava guandu e varria o terrero.
Quando o gato sumia gritava : Quede ele?
Minha vó fazia vassoura de piaçava
Assava batata na fogueira em noite de são João
E teve treze filhos.
E lembro de seus cabelos grisalhos
Que eu pentei, trancei. puxei tentando enfeitar a mulher sem vaidade.
Minha vó era guerreira, meio india, meio branca.
Ela usava foice e plantava cana.
"Dava  de cumê pras galinha" e criava porco.
Minha vó juntava prata em lata de leite
E no final do ano me dava, a lata cheinha de moeda.
Dizia: Prata num serve pra nada.
Ela tava enganada.
Ela gostava de mim.
Eu gostava dela.
Faz tempo que não a encontro em meus sonhos.
Dona Felisbina nunca foi rica
Nem pobre, nem feliz, nem triste.
Era mãe e avó.
Analfabeta e esperta.
Criou os filhos na base da pancada.
Os netos beijava e fazia dengo
Lavou, passou e engomou pra fora
E fazia angú com rapa e chulapa.
Minha avó tinha uma caixa de botões
Costurava e ouvia rádio.
Contava muitas histórias.
Minha vó viu saci, alma penada e mula sem cabeça.
Foi mãe com doze anos.
Dona Felicia era fogo.
Apagava o fogo das filhas com a vassoura.
Ela morou na roça, no morro e em barraco.
Passou fome e teve fartura.
Trabalhava pra comprar mistura.
Nunca foi rica
Nunca foi pobre.
Era mãe e avó.

(Mariani Lima)

Com amor para minha saudosa avó Felisbina (Felícia) de quem tenho boas lembranças sempre.